"Da noite que se apresenta divisa bem, dispersos lampejos piscam no breu. Voam aqui e acolá, revelando os olhos extenuados de uma busca vã. Os grilos e os sapos cantando músicas de incomodar. Cururus tetês? Ventos salinos os trazem, irritam-lhe as narinas desacostumadas, bujarronas que lá deixaram, haveria de crer? A lua some sob as nuvens toscas marinhas, o forro apagado. Ele acompanha o deslocamento daqueles chumaços de trevas, furtivos relâmpagos inflam os fumos de luz. Baixas, espremem-se, compactas, cai-lhe uma gotícula no nariz. É salgada! E tanta água, que corpo desfarela uma argila fina, os ossos grãozinhos de pó encharcados, a vara, o pano e a palha escorridos pelo chão… Do rego de lágrimas passadas, corre um rio que erra por veredas verdíssimas, serpenteia por vales frondosos, contorna serras altíssimas, banha campos nunca semeados… Caudaloso, despenca; calhau não há de represar-lhe o caminho, em braços de cursos se divide, extensas léguas, transpõe barreiras jamais atingidas e, finalmente, num fiapo, deságua como poça, tingindo com sua massa barrenta a areia branca de imenso mar. E o sol que se abrirá em dia amanhecido, secá-lo-á em terra curtida; rasto, raso, resto, por onde os carros de boi passarão..."
Quatro contos ambientados em épocas diferentes, cada qual com seu linguajar peculiar: 1- Estrada: passa-se na década de 1930 no interior de Minas Gerais e Centro-Sul da Bahia, tendo um carreiro (condutor de carro de boi) como protagonista, onde busca redimir-se de um passado de insucessos e de um amor não correspondido;
2- Céu Noturno: década de 1970, antes do advento da informática, um desmemoriado procura se redescobrir a partir de fragmentos do presente, já que o passado lhe é inverossímil;
3- A Carta: década de 1950, durante um enterro, desvela-se um triângulo amoroso ambientado numa pequena cidade do Sul de Minas Gerais;
4- Casca: época atual; num cortiço de uma cidade grande, um moribundo perde-se em suas reminiscências, e um casal tenta se reconciliar. Enfim, seres humanos se equilibrando na corda bamba da vida.
