AVC – Recuperação do Guerreiro da Liberdade

José Saúde

José Saúde

Oh doutor, tens que me fazer um prefácio para o meu livro! E por mais que tentasse fugir, eu que nunca antes tinha feito prefácio para livro nenhum, mas era escusado, o Zé Saúde é mesmo assim, a sua enorme teimosia associada à capacidade de insistir até ao infinito, estão-lhe no sangue e constituem-se como a sua melhor arma, sendo que a arma do “guerreiro da liberdade” é certamente a resiliência. Convenceu-me, está visto.

Depois, aqui há umas semanas atrás lá me trouxe em papel um rascunho, que eu ao ler no computador não me ajeito de todo, e foi um espanto. Em estilo brique-a-brique, é efetivamente um manual alargado, falado na primeira pessoa, elucidando tudo quanto é a manobra estratégica e compensatória; da experiência da incapacidade; o de encontrar soluções para ultrapassar o que nem sempre é fácil, mas que parece possível, pelo menos a crer no que esta “biografia técnica” bem expressa; e para quem conhece o Zé, é óbvio que não há trombose que o deite abaixo.

Mas de facto o que mais me espantou, para além da abrangência da narrativa, é a tentativa de explicar tintim por tintim como tudo se passa, ou como é que foi e qual o mecanismo recomendado, o que mais valorizei foi a constante e forte presença ao longo de todo o percurso, daquilo a que o próprio Zé chama “o poder da mente na reabilitação”.

E é exatamente aqui que está o busílis (sublinho, eu escrevo em crioulo...), é claro que tudo tem a ver com respostas organizadas, programas, terapias e tudo o que de necessáriofor para a otimização do processo reabilitativo, porque sem a “chama”, sem o querer, sem o acreditar que é possível, não se vai lá de todo, e é nesse sentido que este livro é uma verdadeira autoajuda para o paciente afetado por um AVC numa fase pós aguda e em que necessariamente se instala a dúvida, sendo fundamental encontrar motivação mas sobretudo energia para continuar.

Não se sabe bem para onde caminhar, ou se este caminhar resvalará para lugar algum, mas acredito que nesta fase a partilha da experiência do Zé Saúde pode fazer a diferença, pode trazer à tona essa vontade de viver que por vezes parece já não existir, mas que está lá. É aqui que a autoajuda pode fazer toda a diferença, até porque como está comprovado pelo próprio, este método funciona, pelo menos com o Zé funcionou.

E por fim, mas definitivamente não em último lugar, o estilo, a graça, a profundidade de momentos íntimos e de reflexão, a poética dispersa em pequenos apontamentos, mas transversal a todo o texto,  por vezes quase um Brandão, “...mentes anestesiadas e impostas pelas clausuras de uma existência sem rumo, de que somos apenas pequenas gotas de orvalho em folhas decadentes e prontas para à dispersão...”.

A fantasia, que aparece do nada, como quando numa quase ressaca de discoteca nos aparece o D. Sebastião, se não para salvar a pátria, que infelizmente de salvação já não ia ter, mas pelo menos a dar uma lição de autoafirmação, de confronto ganho, de além..., e a alegria, sempre a alegria, a enorme alegria de viver que o Zé Saúde transmite dentro e fora do livro, a alegria como sistema de vida, e perdoe-me ele o comentário mas não me tivesse convidado, para quem jogou no Sporting, como esquema tático, que isto na vida é bola para a frente e fé em Deus, prognósticos só no fim do jogo, e esse ainda vem longe. 

 

Carlos Machado

Médico fisiatra

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