Nasceu numa aldeia perdida para os lados de Vinhais no Concelho de Bragança, entre o frio das pedras, as geadas e a solidão dos campos, o balir das cabras e dos borregos,
a subserviência caprina da mãe e a ignorância besta do pai.
Desde cedo descobriu que havia um outro mundo para lá da aldeia onde nascera, de Vinhais, do Rio Tuela, da capital de Trás-os-Montes, de tudo aquilo que lhe parecia perdido nos confins do nada.
Que havia um mundo com outras aldeias e vilas, e campos e montanhas, e terras por onde passavam rios, e lugares onde se levantavam grandes cidades, algumas delas encostadas ao mar que nunca vira.
Aos dezanove anos abandona a aldeia, os pais, os animais, todo aquele nada e parte para Lisboa para casa de uns tios. Vê-se explorado pelo tio, feirante e comerciante de roupas.
Aprende a “arte” de comprar por uma bagatela e vender com lucro. Por vezes em triplicado. Ao fim de meses tem já vontade de mandar os tios às urtigas mas não tem poder económico para começar uma vida a solo.
O “salário” que o manhoso do tio lhe dá fica quase todo lá em casa.
Aos vinte e um anos a tropa chama-o. Dá-lhe uma farda e uma arma, instrução q.b., mete-lhe na cabeça uma série de patranhas e fá-lo partir num rebanho com mais mil cabeças de tipos como ele para Novo Redondo em Angola.
